(Freguesia da Golpilheira • Concelho da Batalha • Distrito de Leiria)
 
177 – Editorial

177 – Editorial

Laços que nos unem

Partiram há anos, alguns já há várias décadas. Na maioria dos casos, à procura de oportunidades que não encontravam por cá, ou então para fugir de alguma situação menos cómoda, como a fome, o desemprego, a perseguição política ou até a integração num qualquer contingente de soldados. Com a célebre “mala de cartão”, ou até com menos do que isso, tinham no horizonte uma terra onde a sua força de trabalho pudesse ser aproveitada e onde um salário mais avantajado pudesse ajudar a alimentar a família.
Alguns tinham consciência das dificuldades que iriam encontrar, a começar pela viagem “clandestina” e a prolongar-se com o lugar onde morar, com a língua desconhecida, com uma sociedade diferente.
Outros limitaram-se a ignorar o desconhecido e fixaram-se apenas na promessa de que este iria ser o “salto” para uma vida melhor, para o emprego que aqui não tinham, para a comida garantida em cima da mesa que aqui por vezes escasseava, para a liberdade que aqui nem lhes permitia dizerem o que lhes ia na alma.
Todos levavam na bagagem uma enorme esperança num futuro melhor, mas também uma grande dose da portuguesíssima “saudade”, um laço impossível de desatar com a família, os amigos e a terra. Só que, num qualquer dia das suas vidas, a necessidade de partir foi maior do que a vontade de ficar e esse laço foi esticado além fronteiras, por vezes, além-mar, para os mais variados destinos do mundo.
Alguns encontraram o que procuravam, sobretudo o trabalho, normalmente no “duro”, mas que lhes permitia uma rápida forma de subsistência, e a casa, por exemplo no bidonville de Champigny-sur-Marne ou de outra qualquer periferia citadina, mas que lhes dava um abrigo minimamente seguro e habitável. Mas houve também os não chegaram a cruzar a fronteira, ou os que não resistiram às agruras do “estrangeiro” ou da saudade de casa.
Quase todos os que ficaram acabaram por construir o seu sonho, conquistando a pulso em lugar próprio nestas novas sociedades. Compraram ou edificaram as suas casas, subiram de categoria nos seus empregos, estabeleceram as suas empresas e negócios, “mandaram vir” as famílias para junto de si ou constituíram família nessas pátrias de acolhimento. Aos poucos, foram-se tornando cidadãos de pleno direito.
Foi o caso de José Pragosa, natural da Golpilheira, um dos “nossos”. Partiu daqui muito novo ao encontro de um tio que estava em Paris, com pouco mais do que as ilusões próprias dos seus 15 anos, não levando, sequer, a necessária autorização dos pais. “Uma aventura”, como ele próprio classifica, sem medir riscos ou consequências, apenas em resposta a uma vontade de ser mais do que um serviçal ajudante de pedreiro na sua terra natal. Um conjunto de acasos permitiu que chegasse ao seu destino e a sorte que o acompanhou ditou que não fosse de imediato “repatriado” pelo tio. Arranjou trabalho e por lá ficou até hoje com a família, sendo um exemplo dos que foram bem sucedidos.
Mas o certo é que a grande maioria nunca deixaram de se sentir portugueses, nunca perderam essa ligação quase umbilical à sua terra de origem e foram sempre aproveitando todas as oportunidades, normalmente nas férias, para vir “matar saudades”. E, nos locais onde se encontram, afirmam orgulhosamente a sua pertença a essa comunidade emigrante com que continuam a identificar-se.
Enquanto os da “primeira vaga” estão a caminho da reforma ou já no gozo de um merecido descanso, os filhos já beneficiaram do “caminho desbravado”. Nasceram ou cresceram “franceses”, estudaram e formaram-se nos mais variados domínios, arranjaram empregos em todos os ramos de actividade, estão plenamente integrados no tecido social e mesmo em relevantes cargos políticos. A ligação à terra dos pais já não é tão forte, embora continuem a frequentar espaços onde a presença portuguesa é evidente, seja na gastronomia, seja nos canais disponíveis nas televisões, seja nas conversas que se cruzam com uma imperial na mão, de ambos os lados do balcão. E, quando se fala da “sua” terra… lá se ouve o nome de uma qualquer aldeia “à beira mar plantada”.
Vem isto a propósito do encontro de emigrantes em que participámos e das conversas que de lá trouxemos.
Continue a ler, no post seguinte…

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