>Alcobaça e Óbidos também no grupo
Outra coisa não seria de esperar. Os portugueses elegeram como uma das 7 maravilhas nacionais o Mosteiro de Santa Maria da Vitória, após alguns meses de votações pela internet e por telefone. A lista dos eleitos entre os 21 finalistas foi apresentada no passado dia 7 de Julho, numa espectacular cerimónia organizada no estádio da Luz, em Lisboa
A par do Mosteiro da Batalha, também o de Alcobaça, igualmente pertencente à área geográfica da Região de Turismo Leiria/Fátima, foi um dos escolhidos nesta lista restrita de importantes monumentos nacionais. E podemos destacar, ainda, o castelo de Óbidos, um monumento perto de nós, que fecha um triângulo turístico de luxo na região Centro do País. A este propósito, convém não esquecer alguns dos que ficaram de fora, mas que, pela sua beleza e importância histórica, não devem deixar de merecer a nossa visita, como será o caso do Convento de Tomar e do castelo de Leiria. Dada a extensa lista do belíssimo património arquitectónico português, é óbvio que nem todos poderiam ficar neste grupo tão “apertado” de sete, cabendo apenas mais quatro eleitos: o Mosteiro dos Jerónimos (Lisboa), o Palácio da Pena (Sintra), a Torre de Belém (Lisboa) e o Castelo de Guimarães, berço da nacionalidade.
Júlio Órfão já havia dito, por diversas vezes, que “algo estaria muito mal no nosso país, se o monumento batalhense ficasse excluído dos sete primeiros”, tanto pela sua beleza e grandiosidade, como pela marca histórica que representa para Portugal como nação independente. Também António Lucas, presidente da Câmara da Batalha, considerou esta nomeação como mérito da “beleza e estética do monumento, bem como da sua carga histórica”, agradecendo a todos aqueles que votaram e que contribuíram para esta eleição.
O Mosteiro de Santa Maria da Vitória é o mais importante símbolo da Dinastia de Avis, construído por iniciativa de D. João I, na sequência de um voto à Virgem, caso vencesse a Batalha de Aljubarrota contra os castelhanos. As obras decorreram entre 1388 e 1580, ao longo de seis reinados. É o grande monumento do gótico final português, um dos primeiros onde ao gótico flamejante quinhentista se juntou a nova arte manuelina de seiscentos, símbolo da expansão marítima portuguesa.
O arranque das obras deu-se em 1388 e foi conduzido por Afonso Domingues. A ele se atribui o plano geral da construção e o grande avanço dos trabalhos na igreja e no claustro. A magnífica igreja de três naves e transepto saliente, por si delineada, com cabeceira de cinco capelas, sendo a central de duplo tramo e terminação poligonal, terá sido o ponto alto da sua carreira.
Com efeito, a partir de 1402, a chefia do estaleiro foi entregue a Huguet, arquitecto de provável origem catalã, que inaugurou entre nós o tardo-gótico. Documentado à frente do projecto até 1438, a ele se deve o abobadamento dos espaços da igreja e da Sala do Capítulo (onde experimentou, pela primeira vez, uma abóbada estrelada), a construção da Capela do Fundador, o início das obras das Capelas Imperfeitas, bem como a conclusão da fachada principal, onde sobressai o portal axial. Este é delimitado por um arco canopial, que integra os escudos de D. João I e de D. Filipa. No tímpano, exibe-se Cristo em Majestade, ladeado pelos Evangelistas, e as arquivoltas são repletas de figurações que continuam pelas estátuas-colunas, ao abrigo de um complexo programa iconográfico.
Contudo, a mais emblemática obra de Huguet é a Capela do Fundador. Ela foi concebida para panteão régio. É um compartimento quadrangular, que se adossa aos três tramos ocidentais da fachada lateral Sul e integra, ao centro, um esquema octogonal de suportes onde descarrega a abóbada estrelada. No circuito interior desta capela, colocou-se o túmulo duplo de D. João I e de D. Filipa, realização sem antecedentes no nosso país. Na capela repousam também os filhos do casal régio (como D. Henrique e o regente D. Pedro), de acordo com a decisão testamentária de D. João I em fazer deste espaço um efectivo panteão.
Em 1436, D. Duarte decidiu edificar uma capela funerária para si próprio. O projecto concebido por Huguet privilegiava uma planta circular, que não viria a ser concluída, por morte do mestre. Desta forma, a construção cessou até ao reinado de D. Manuel e, mesmo nessa altura, não foi concluída. Razão de esta parcela ser conhecida como as Capelas Imperfeitas.
No reinado de D. Afonso V, edificou-se o segundo claustro do mosteiro. Ele resulta da intervenção do arquitecto Fernão de Évora e, estilisticamente, é uma obra que contraria o tardo-gótico de raiz flamejante, tendo-se optado deliberadamente pela austeridade arquitectónica, que rejeita até a inclusão de capitéis a marcar o arranque dos arcos.
Só no século XIX o Mosteiro voltou a ser intervencionado, desta vez com o objectivo de restaurar o conjunto. Esta campanha prolongou-se por meio século e é um capítulo fundamental da nossa história do restauro monumental. Em 1983, este monumento foi classificado como Património Mundial pela UNESCO.
O actual director do Mosteiro continua a reclamar a necessidade de intervenções de fundo para garantir a sua preservação, com especial atenção do desvio do IC2 que lhe foi colocado à porta nos finais do século passado e teima em querer sair. Várias têm sido as promessas e estudos apresentados por diversos governos, mas até à data a obra não passou do papel.
Outra das lutas de Júlio Órfão tem sido contra a realização das festas de Agosto nas traseiras do monumento, que considera “gravemente prejudicado” com os ruídos provocados pelas potentes aparelhagens sonoras dos agrupamentos que ali actuam, sobretudo para os vitrais. A esse propósito, o presidente da autarquia mantém a sua intenção de retirar os festejos daquele local, apenas quando o IPAR avançar com o arranjo do espaço junto às Capelas Imperfeitas, um dos piores cartões de visita da vila.
Ainda em relação àquele espaço, onde existiu a Igreja de Santa Maria a Velha, local onde foram sepultados os grandes mestres do Mosteiro, as escavações deste templo, destruído no século passado, revelaram merecer alguma atenção. José Travaços Santos, historiador batalhense, tem sido das vozes mais insistentes pela sua preservação e pela edificação no local de um memorial daquela antiga igreja. Surgiram já algumas propostas nesse sentido, mas as escavações estão paradas e não está ainda definido o que se irá fazer em concreto.
Espera-se que, com mais este prémio da conquista de um lugar entre as sete maravilhas nacionais, as entidades responsáveis avancem definitivamente para uma solução que dê beleza àquela zona e devolva ao monumento a tranquilidade de que necessita para se manter de pé.
Luís Miguel Ferraz