(Freguesia da Golpilheira • Concelho da Batalha • Distrito de Leiria)
 
Karolina, a jovem de 25 anos que dá formação artística na Golpilheira

Karolina, a jovem de 25 anos que dá formação artística na Golpilheira

“Desabafo o que sinto por meio da pintura”

A Junta de Freguesia da Golpilheira está a organizar nas suas instalações, desde Março, uma oficina de pintura para residentes que aceitaram inscrever-se para aprender esta arte. Karolina Sudacova, de 25 anos, é a professora contratada para estas aulas.

Karolina é ucraniana e veio para Portugal, aos 4 anos, com os pais. Aos 8 anos, voltou para a Ucrânia para viver com os avós, tirou o curso de Artes Decorativas de Tecelagem, mas o coração ficou sempre em Portugal…

Entrevista de Ângela Susano

Aos 19 anos regressaste a Portugal. Conta-nos a tua experiência.

Voltei para Portugal com a minha irmã mais nova. Já não sabia falar português, tinha-me esquecido da língua portuguesa, então foi muito difícil arranjar cá trabalho. Decidimos ir para a Polónia e aos 21 anos fui trabalhar para a Eslováquia.

Durante estes anos sentia-me um pouco perdida e andei a redescobrir-me. Qual seria o meu propósito e o meu lugar. Na Eslováquia trabalhava num restaurante, mas com a pandemia fechou e eu não conseguia voltar para a Ucrânia, porque as fronteiras estavam fechadas. Então, em Abril de 2020, voltei para Portugal e fiquei cá até hoje. Quando regressei, estive 6 meses a aprender, de novo, a língua portuguesa para depois procurar trabalho. Agora trabalho na Papelaria Americana.

Onde é que entra a pintura na tua vida?

A pintura funciona mais como um passatempo, porque é difícil viver apenas da pintura e dedicar-me como gostava. Em casa, nos meus tempos livres, estou sempre a pintar. Trabalho na Papelaria Americana e lá também dou formações de pintura a crianças e adultos.

Tenho muitos trabalhos em casa, tenho a casa cheia de telas, e tive a oportunidade de os expor. Fiz 2 exposições em Portugal, uma no Posto de Turismo de Leiria e outra na Biblioteca Municipal de Leiria.

Quando é que percebeste que gostavas de pintar?

Foi por volta dos 12 anos. Na escola, um professor pediu-nos para fazer um desenho ou uma pintura sobre o universo. Eu gostei muito da ideia. Inspirei-me num livro que me tinham oferecido sobre os planetas e os aliens e fiz uns desenhos com lápis de cor. Quando apresentei o trabalho na escola, ninguém acreditou que fui eu que o fiz. E eu não percebi o porquê de não acreditarem.

O desenho seria para participar num concurso. Eu tinha-o feito em A3 e o professor pediu-me para ficar na escola e voltar a fazer o trabalho num formato maior, em A1, para participar no concurso. Eu voltei a desenhar e o professor ficou impressionado, gostou muito do meu trabalho. Ganhei o 1.º lugar do concurso. Foi a primeira vez que ganhei alguma coisa e com um dom que eu nem sabia que tinha.

Ganhei o gosto pela pintura e o meu professor aconselhou-me a tirar o curso de artes. Mas a escola de artes ficava a 150 km de minha casa e o meu avô não me queria deixar ir sozinha. Eu só tinha 15 anos.

Fiquei naquela escola mais 1 ano e eu e o meu professor andámos a tentar convencer o meu avô para me deixar ir tirar o curso de artes. Eles queriam que eu seguisse medicina. Mas depois de concluir o 10.º ano, consegui ir para a Escola de Artes, com o apoio do meu avô.

Quando regressei a Portugal, a minha ideia era ir para a Universidade, mas precisava de dinheiro para estudar. Fui trabalhar e acabei por não voltar a pensar em ingressar na Universidade.

Porquê Portugal?

Sempre adorei o país. Portugal marcou muito a minha memória de infância, tive momentos felizes e sempre quis voltar para cá.

Andei por vários países, mas Portugal é sempre onde me sinto melhor. Gosto muito das pessoas, da natureza e do ambiente. Preciso de estar aqui. Custa-me mais sair de Portugal do que da Ucrânia. O que me deixa saudades da Ucrânia é a minha família que lá está.

Imaginas-te a viver em Portugal para sempre?

Sim. Gostava de viajar mais e fazer férias fora de Portugal, mas com a certeza de regressar sempre para cá.

Quais são as técnicas e materiais que utilizas na tua arte?

Gosto de usar várias técnicas e vários materiais. Gosto sempre de aprender coisas novas e usar técnicas mistas, mas a minha técnica favorita é óleo em tela.

Quais são os trabalhos que te distinguem?

Tenho várias obras de que gosto muito. Mas a primeira que me vem à cabeça é uma que tenho exposta e à venda. É o corpo de uma mulher que está a deitar chamas do peito.

Mas há muitos trabalhos meus de que gosto.

Qual é a tua inspiração quando estás a pintar?

Emoções. O que penso, situações pelas quais passei e coisas que estou a sentir… é nisso que me inspiro. Passo para a tela o que estou a sentir no momento. Desabafo o que sinto por meio da pintura. Tenho de estar a sentir uma emoção muito forte que transmito, desabafo e mostro na tela.

Se não termino o trabalho e o sentimento muda, deixo as obras inacabadas. Mas se estou a sentir muito alguma coisa naquela altura, também consigo começar e acabar no mesmo dia – dure 1 hora ou 6 horas – sem olhar para o relógio, sem comer ou dormir, porque estou focada naquilo e quero muito transmitir o meu sentimento.

Como surgiu esta ideia de dares estas aulas na Golpilheira?

Foi uma sugestão do presidente da Junta de Freguesia, José Carlos Ferraz, que foi à Americana e me convidou para dar aulas. Adorei a ideia.

O objectivo é que a população faça mais actividades, não se isole e venha aprender. É muito bom fazer trabalhos manuais e puxar pela nossa criatividade, sairmos da nossa zona de conforto, aprendermos e conhecermo-nos melhor.

O que estão a desenvolver nestas aulas?

Aqui, estamos a fazer pintura em tela. Foram os alunos que escolheram o que queriam fazer. Cada um está a encontrar o seu estilo. E a ideia será cada um perceber qual é o trabalho que quer fazer a seguir. Pode ser pintura em tecido, aguarela ou outro material e outra técnica. Estão a começar a conhecer-se a si próprios.

Todos nós podemos aprender a ser artistas ou o talento já nasce connosco?

Eu acho que é preciso ter talento, mas também é importante trabalhá-lo. Porque há quem tenha talento e não o trabalhe e o talento acaba por se perder.

Mas também acredito que trabalhando, estudando, aprendendo e praticando, é possível fazer bons trabalhos.

Isto ou aquilo?

Ser sonhadora ou ter sempre os pés assentes na terra? Ser sonhadora

Verão ou Inverno? Verão

Filme romântico ou filme de terror? Romântico

Comida portuguesa ou comida ucraniana? Portuguesa

Chá ou café? Café

Netflix ou YouTube? Netflix

Doce ou salgado? Salgado

Pedir comida em casa ou sair para comer? Sair para comer

Manhã ou noite? Noite

Livros ou séries? Livros

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