(Freguesia da Golpilheira • Concelho da Batalha • Distrito de Leiria)
 
As duas invocações da ermida de Bico Sachos

As duas invocações da ermida de Bico Sachos

A propósito da “encamisada” a 7 de Junho…

Com a proximidade do círio a Santo António, denominado de “encamisada”, que sai da Rebolaria e percorre os lugares do Arneiro, Forneiros e Casal do Alho e agora também a Ponte Nova, já na vila, este ano a realizar-se em 7 de Junho, veio-me à lembrança o Bico Sachos, porque, já lá vão uns trinta anos, o rebolariense Manuel Pereira Jordão, ao informar-me sobre a “encamisada” me disse que no Bico Sachos também teria havido uma manifestação semelhante. Possivelmente, seria para reverenciar o taumaturgo que foi a primeira invocação da desaparecida ermida da pequena povoação da freguesia da Golpilheira, conforme refere “O Couseiro”, invulgar livro de memórias do Bispado de Leiria, provavelmente escrito no século XVII: “No logar de Bico-sachos esta outra (ermida), da invocação de Santo António, feita e dotada por um sacerdote, chamado Jeronymo Ribeiro, no ano de 1625; consta do livro 3.º do registo, a fl. 43 v.º”.
De Santo António no século XVII, logo no século XVIII passou a ser da Senhora do Ó. Di-lo em 1758 o Vigário da Batalha, Padre Paulino da Silva Carvalho, naquele valioso inquérito sobre as paróquias do País, as suas povoações, a sua população, a sua actividade económica, as suas serras e os seus rios, feito depois do tremendo terramoto de 1755: “No lugar de Bico Sachos, a Ermida de Nossa Senhora do Ó tem bom Património, e hum Altar, administrado pelo Reverendo Padre Manoel de Oliveira Guerra morador no Cazal das Ortas”.
É curioso referir que nesse ano de 1758 tinha o lugar de Bico Sachos treze vizinhos (casas habitadas) e quarenta e nove habitantes, enquanto os seus próximos Casal das Hortas e S. Sebastião do Freixo tinham doze casas habitadas e quarenta e cinco habitantes.
A última invocação da ermida, que é de lamentar ter sido destruída, erguida em 1625, traz à colação a forma como é representada a imagem da Senhora do Ó e a sua invulgar designação.
A origem da invocação está “na recitação das 7 Antífonas que começam por Ó – Ó Sapientia, Ó Adonai, Ó Radix, Ó Clavis, Ó Oriens, Ó Rex, Ó Emmanuel – nas vésperas do Ofício Divino, desde 17 a 23 de Dezembro. Esta festa já vem do Concílio de Toledo, realizado no século VII”, escreve o Padre Dr. Jacinto dos Reis no seu precioso livro “Invocações de Nossa Senhora em Portugal de Aquém e de Além-Mar e seu Padroado”.
A representação da Senhora do Ó faz-se pela imagem da Senhora grávida, com uma das mãos protegendo a barriga e com a outra erguida e espalmada, como que a afastar o mal que tenta afectar o Filho Divino, que esta a gerar. Portanto, nunca com o Menino ao colo, que é atributo doutras invocações da Virgem. Por isso mesmo, também a designação de imagem da Expectação do Parto da Santíssima Virgem. E, ainda, Senhora da Anunciação, neste caso, tendo ao lado o Anjo Anunciador.

A fotografia que se reproduz é da imagem da singular Senhora do Ó que está à entrada da Casa do Capítulo do Mosteiro de Santa Maria da Vitória. A mão direita foi partida. Mas esta imagem tem ainda a originalidade da Virgem ostentar um colar de seis mãos espalmadas, símbolo já utilizado há talvez milénios pelos povos mediterrânicos, cristianizado nas mãos da Senhora do Ó e islamizado nas mãos da Princesa Fátima, filha de Maomé.

José Travaços Santos

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